quinta-feira, 4 de outubro de 2007

50 anos depois do Sputnik, o que vamos fazer do espaço?


Em 4 de Outubro de 1957 foi lançado o primeiro satélite. Daqui a 50 anos, onde estaremos? Marte, via Lua,é o próximo grande objectivo
Ainda não estamos a caminho, mas o próximo grande alvo da exploração espacial é uma viagem tripulada a Marte. Senão, a Agência Espacial Europeia (ESA) não teria lançado um repto aos habitantes da Terra, em Junho: candidatem-se a uma missão ao planeta vermelho. Simulada, é certo, mas com peripécias reais garantidas.Ou não tivesse a ESA prometido aos candidatos uma vida árdua. Vão ficar encerrados 520 dias em 200 metros quadrados, só vão ver as caras uns dos outros, cada mensagem para o exterior demorará 20 minutos a chegar ao destino e vice-versa, como se estivessem já em Marte. E a comida que levarão, sensaborona, como a que os astronautas a sério comem no espaço, terá de bastar para toda a missão. Nada disto assustou os 5610 candidatos que apareceram para os seis lugares disponíveis (o prazo das candidaturas terminou em Setembro), o que pode ser um barómetro sobre os actuais sonhos humanos para o espaço.A selecção será como a dos astronautas a sério. "Queremos ter um reflexo razoável de uma tripulação real", explica Marc Heppener, da ESA, citado no site da agência. "Devem ser pessoas com qualificações médicas, algumas qualificações em engenharia, em ciência. Seremos um pouco menos exigentes nas capacidades físicas."A nave onde embarcarão, no fim de 2008 ou início de 2009, os seis bravos não passa de um conjunto de contentores, onde se instalará o laboratório médico e de investigação, a cozinha, a sala de ginástica e o compartimento da tripulação. Terão de desempenhar tarefas como numa viagem verdadeira a Marte. Tanto nas emergências simuladas como em problemas médicos reais, estarão por sua conta. A estadia é paga ("não será um grande salário", esclarece Heppener) e serão sempre filmados. Ao fim de 250 dias de "viagem", simularão a chegada ao solo marciano, num contentor que fará de veículo de descida, onde os pseudo-astronautas permanecerão durante a estadia no pseudo planeta vermelho. Mas esta nave nunca descolará do Instituto para Problemas Biomédicos, em Moscovo, parceiro da ESA nesta missão. A ideia é que este Big Brother Marciano com os Pés na Terra facilite a vida a quem for mesmo a Marte, antecipando o que pode acontecer numa missão tão longa. Os aspectos psicológicos e médicos são os que mais interessam aos cientistas envolvidos na experiência. Surgirão conflitos, sem possibilidade de regresso a meio da missão. Afectá-la-ão? "Queremos ver os efeitos psicológicos da situação na saúde mental e no desempenho de certas tarefas, incluindo as mais críticas para a missão", explica Heppener. Estudar-se-á ainda a influência de um espaço tão confinado no sono, no stress e no sistema imunitário, além do impacto das diferenças de personalidade na missão. "Temos experiência em ter astronautas na Estação Espacial Internacional, mas astronautas em viagem para Marte é outro campeonato", diz Heppener. "Como evoluirão as relações do grupo? Que perigos podem surgir? Como se podem evitar? Poderemos aprender que tipos de personalidade devemos seleccionar numa missão real."O sonho de ir a Marte sempre esteve num cantinho da mente humana, ou não fosse a ficção científica uma das suas manifestações.De planeta vermelho a azul Passados 50 anos do lançamento do Sputnik, o satélite soviético que marcou a chegada da humanidade ao espaço, e 38 anos depois da ida dos americanos à Lua, até que ponto esse sonho consta dos planos das agências espaciais? Em 2001, a ESA já tinha incluído nos seus planos uma missão tripulada a Marte daí a 30 anos, com passagem eventual pela Lua. Mas foi o anúncio, em 2004, do Presidente dos EUA, George W. Bush, que pôs as viagens a Marte na agenda mediática: até 2020, a poderosa NASA iria regressar com uma tripulação à Lua, onde estabeleceria uma base lunar em 2024, para avançar para Marte. Para Carlos Fiolhais, físico da Universidade de Coimbra, irem humanos a Marte é, de facto, o grande desafio da exploração espacial. "Tecnicamente, é possível. Não é mais difícil do que ir à Lua." Tal viagem, acrescenta, é mais uma questão de vontade colectiva e de dinheiro do que de engenharia. Mas a guerra que os EUA travam no Iraque poderá fazer derrapar os prazos para 2050: "A guerra é muito cara e o fim não está à vista. Tudo dependerá do próximo Presidente americano e da solução dessas questões." Já para o engenheiro aeroespacial Tiago Hormigo, da empresa Spin.Works, a exploração da Lua por uma tripulação na Lua é o desafio imediato: "Marte é um objectivo a longo prazo. Não se sabe quando (ou se) existirá disponibilidade financeira. Ainda haverá tantas Administrações americanas."Quanto à Lua em si mesma, o que interessa tanto? Já lá fomos. Agora queremos voltar para desenvolver tecnologias, saber como é viver fora da Terra, aprender a manipular materiais noutros planetas, por exemplo extrair oxigénio do solo lunar, água congelada dos pólos ou alumínio e ferro para construir uma base. Explorar substâncias que são raras na Terra é outra hipótese. Também pode servir de interposto rumo a Marte, de onde é mais fácil uma nave levantar voo.E por que queremos ir a Marte? Uma das razões é esclarecer se tem ou já teve vida microscópica, um eterno enigma. Por melhores que sejam as sondas, nenhuma substitui um humano no terreno. Mas algo mais profundo nos impele. "Porque é o destino da espécie humana: explorarmo-nos a nós próprios, explorar a Terra, explorar o espaço", diz Tiago Hormigo. "Porque está lá", responde Carlos Fiolhais, parafraseando Edmund Hilary sobre as razões por que escalou o Evereste. "Não será por nenhuma razão prática, a não ser a necessidade de alargar os sítios habitados pelo homem", acrescenta o físico. "Razões práticas podiam ser a Terra tornar-se inabitável. O único sítio habitável perto, a não ser a Lua, é Marte." 5610 Número de candidatos dispostos a passar 520 dias em 200 metros quadradospara simular viagem a Marte


A superfície de Marte fotografado por uma sonda espacial

04.10.2007, Teresa Firmino
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